Após dois anos de pandemia, vivemos mergulhados na hipercomunicação. Passamos horas lendo, compartilhando, comentando conteúdos a ponto de termos criado um termo para um distúrbio contemporâneo: FOMO (fear of missing out), a fobia de se sentir ignorante sobre o que está acontecendo, o que é trending topic, de estar, simplesmente, por fora.
Todos os dias, uma enxurrada de conteúdos sobre (quase) tudo é despejada em todas as mídias, e todos, por mais leigos no tema, sentem-se compelidos a opinar, transformados em experts auto titulados. A velocidade vertiginosa acaba induzindo à perpetuação da enxurrada de conteúdos, cada vez menos embasados, numa espécie de “telefone sem fio” anabolizado, em que o que normalmente já nasce ruim, acaba tendo uma trajetória devastadora e melancólica. Como já profetizado por Umberto Eco, “o drama da Internet é que ela promoveu o idiota da aldeia a portador da verdade”.
Mas, e como tratar a questão, por exemplo, da liberdade de expressão? Devemos lutar por ela acima de tudo – de certa maneira, o modelo norte-americano – ou devemos limitá-la (como faz o Brasil, tipificando como crime discursos de ódio e, consequentemente, limitando a liberdade de manifestar desprezo por parcela da humanidade)?
O tio de Peter Parker já sabia que com grandes poderes vêm grandes responsabilidades. A liberdade de expressão, amplificada pelos canais contemporâneos de comunicação é um enorme poder. Mas, aparentemente, não estamos ainda entendendo a responsabilidade que deveria acompanhá-lo (embora haja instituições públicas e privadas trabalhando e atuando, e, como citado, já haja legislação clara sobre o tema).
O tal do paradoxo de Popper, mais citado até que a frase do Umberto Eco, diz que até a tolerância tem um limite: a intolerância não pode ser tolerada.
Talvez, antes que nos vejamos obrigados a defender a regulação externa (seja pelo Estado, seja pelas empresas que detém as “novas mídias”), uma vez que não estamos sendo capazes de nos comportar de maneira responsável com os poderes que conquistamos, será que não devemos, coletivamente, buscar reequilibrar o jogo e fazer da responsabilidade algo à altura do poder?
Explico melhor: nós, que trabalhamos e vivemos a Comunicação, devemos ser, na sociedade, aqueles capazes de identificar formas mais hábeis de nos comunicar com o intuito de ajustar nosso olhar e compreender a força e o valor do conteúdo de qualidade. E uso aqui qualidade num patamar ainda bastante rasteiro: que ao menos não se minta ou falseie ou omita, com o objetivo de induzir ao erro.
Vamos além: o Thought Leadership, expressão de ideias que demonstram que uma pessoa tem experiência em um determinado campo, área ou tópico, pode ser uma poderosa ferramenta a ser adotada por uma empresa, marca ou liderança para trabalhar conteúdos de forma responsável, relevante.
São muitas, simultânea e igualmente relevantes as agendas, hoje: liderança feminina, questões identitárias (“gênero” e “raça”, principalmente), empreendedorismo, ESG, inovação, tecnologia, sustentabilidade, etc.
Um bom exemplo de Thought Leadership é o TOP Voice LinkedIn, a seleção de perfis locais e globais que, a partir do seu volume de rede e engajamento, reverberam sua voz, suas opiniões e conhecimento entre milhares de pessoas. Lugar para poucos e bons!
Nosso esforço no caminho da autorregulação pode começar por aí: lideranças hábeis, engajadas com o compromisso de gerar e propagar conteúdos e mensagens genuínas, subindo a barra das discussões com temas tratados de forma embasada. Ouçamos quem tem, de fato, o que dizer. Tentemos não reverberar e, pior, até amplificar, as vozes de palpiteiros, sejam eles bem ou mal-intencionados. Quanto mais espaço for ocupado pelos responsáveis, menos haverá para os que apostam – e muitas vezes lucram – na confusão e disseminação de mentiras.
Vamos sempre enaltecer as vozes que consigam provocar o interesse da sociedade com o objetivo de criar diálogos, que não questionem o que, coletivamente, já temos pacificado, como por exemplo: o nazismo é inaceitável e não pode ser relativizado; a democracia não é perfeita, mas é o melhor que conseguimos produzir até hoje.
Esta pode ser uma forma de diminuir o ruído e a confusão: nós, gestores de Comunicação, somos parte fundamental desta equação. Vamos aumentar o som e circulação de verdades e generosidade, e tentar, assim, impedir o eco de atitudes, gestos e falas encharcadas de violência e mentira, que acabam por intoxicar nossas vidas.
Levemos o “idiota da aldeia” de volta à sua real dimensão.
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