Outubro de 2023. O menino palestino está assustado, paralisado. Corpo treme. Olhos arregalados. Pavor. Medo. Crise de pânico. Abraçado pelo médico, chora, num desabafo incontrolável. Os soluços comovem. E simbolizam a guerra.
1943. A adolescente judia esconde-se no sótão do prédio. Amsterdam, ocupada por nazistas alemães. Escreve um diário narrando sua angústia, ansiedade, tensão. Perseguição, racismo. Guerra.
Oitenta anos separam as duas guerras. Tantas mais aconteceram antes e durante. Tantas acontecerão.
O ser humano alcançou estágios inimagináveis, na tecnologia, na medicina, nos esportes — e continua guerreando como nos tempos das cavernas. Em nome de uma nação, uma crença ou uma ideologia, muito se matou. Muito se mata.
Do homo sapiens aos tempos de Inteligência Artificial, o que mudou nas guerras além da sofisticação armamentista? O homem contemporâneo, evoluído, civilizado, conectado virtualmente, mata e tortura tal qual um medieval, bárbaro e inculto dos séculos passados. As guerras e o dia-a-dia traduzem o mesmo clima fundamentalista, de ódio e intolerância, em que o outro deve ser exterminado pelo simples fato de ser diferente.
Ano Novo. Esperança de um novo-tempo. Chega dia 2, avançamos a fevereiro, Carnaval, Semana Santa, quando nos damos conta passaram os Dias das Mães e dos Pais. Logo nos deparamos com outubro, e não tarda a percebermos os arranjos natalinos. Assim, renovamos as expectativas esquecidas ao longo dos meses.
O que fazer? Não perder a capacidade de indignação e luta. Resistir no dia-a-dia. A jornalista Eliane Brum usa a metáfora da floresta — onde a seca é superada pela chuva, flores surgem nos lugares devastados, fungos se comunicam, árvores conversam e animais semeiam a mata. E nós, que semeamos — por inércia ou complacência — a guerra no mundo e o clima de ódio no cotidiano, precisamos refletir sobre como aprendemos tão pouco em séculos de existência. Nós, isolados por meses (com a pandemia e o vírus mortal), insistimos em isolar o outro pela morte. Pelo ódio.
Lutemos como floresta, agarrando-nos às brechas da vida, usando a alegria como forma de resistência, ocupando os espaços vazios. Lutar con-vivendo: dançando, fazendo arte, conversando, festejando, beijando, rindo com o outro, não do outro. Mirando no menino palestino e na adolescente judia, pensemos sobre isso, neste novo-tempo que nos espera.
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