Não há fórmula mágica pra ganhar Leão de PR em Cannes. Mas existe, na verdade, uma fórmula já decifrada:
Como diria o Coronel Hans Landa, no impagável Bastardos Inglórios, faça isso e…“it’s a bingo!”, você ganhou um Leão! Foi o que aconteceu, de novo, este ano: a agência sueca Forsman & Bodenfors, uma das hotshops mais criativas do mundo, levou o Grand Prix de PR com o case “The Organic Effect”, para a rede local de supermercados Coop.
Sem querer dar uma de chato (mas já sendo) ou discutir o mérito da ideia (que é bonitinha), mas fazendo uma análise criteriosa dos trabalhos inscritos neste ano, o resultado teve um gosto de manga com leite: não caiu bem. Ficou muito aquém dos Grand Prix dos anos anteriores e, honestamente, inclusive de alguns trabalhos que concorreram este ano. (Aliás, parabéns aos vencedores brasileiros: Ogilvy, W3Hause FCB.)
Mas tudo isso é secundário diante da discussão que realmente importa. Cannes 2016 deixou claro que a indústria precisa responder, definitivamente, duas questões:
Para mim, as duas respostas apontam para dois sonoros “Não”.
A primeira resposta tem a ver com o papel de protagonismo que a disciplina de PR vem adquirindo na indústria. Desde que debutou em Cannes, em 2009, a ferramenta evoluiu de “soft power” para uma crescente força agente de mudanças de comportamento. Num mundo que acompanhou nos últimos anos o advento da tecnologia, das relações diretas e do resgate de valores como transparência e autenticidade, PR se mostrou uma ferramenta poderosa para participar das conversas ao redor das marcas e gerar conversões das mais variadas, independentemente de que tipo de mídia é utilizado.
O problema é que a ascensão de PR para uma disciplina de primeiro nível escancarou o despreparo da maioria das agências especializadas em mostrar o real valor dessa entrega para seus clientes – e, por consequência, para toda a indústria. Muitas agências de comunicação corporativa, de um dia para o outro, ficaram pressionadas a se tornar algo que nunca foram: criativas, digitais, orientadas a resultados e boas de venda.
Enquanto a maioria das agências puras de PR viviam esse dilema, as agências puras de publicidade enxergaram no PR uma oportunidade de fazer a diferença para seus clientes – e criaram uma fórmula simples, direta e vendável para dar as cartas nessa disciplina. Em Cannes, conseguiram.
“It’s a bingo!”
Ocorre que essa discussão precisa ser superada – sobretudo pelas agências oriundas de PR. Há muito tempo as agências de comunicação tem se tornado híbridas, agnósticas de ferramentas e focadas em construir estratégias realmente eficazes de negócios. Na verdade, acompanham o raciocínio dos consumidores, que cada vez menos se importam com meios e cada vez mais com mensagens. Então não faz sentido ficar discutindo todos os anos, à exaustão, a ausência já quase habitual das agências de PR entre as premiadas.
Já deu.
Get over.
Move on.
Boas ideias serão sempre valorizadas pelos clientes, venham elas de onde vierem. Se uma agência de PR/whatever não tem como ponto forte uma boa ideia ou não sabe como emplacar uma, está na hora dela se reinventar.
Já a segunda questão é mais complexa. Uma bela sacada que bombe na “mídia espontânea”, gerando grande visibilidade, pode ser linda, maravilhosa e sensacional. Mas não é suficiente para ser um case de PR do mundo real.
Stuart Smith, um dos grandes gurus da comunicação mundial, costuma dizer que uma grande estratégia de PR deve remodelar um conceito de marca para conectá-la de forma autêntica com os consumidores, influenciando conversas num mundo cada vez mais repleto de fontes de informação.
Em outras palavras, PR é um agente legítimo de mudança de atitude e de comportamento das pessoas. Algo que, infelizmente, nem sempre é algo comprovado nos casos finalistas em Cannes. Não só nos resultados, mas muitas vezes até no meio para consegui-los. A própria shortlist deste ano tem dois casos polêmicos, que são questionados em termos de autenticidade. Um deles é o caso doReclame Aqui e o outro é o próprio Grand Prix.
Será que uma boa sacadinha sem substância ou que flerta com o “fake” é PR de verdade? Ou é PR pra publicitário ver na Côte D’Azur?
Eis uma discussão indigesta, mas necessária. E urgente.
Enquanto você pensa sobre isso, aqui vão os casos que, entre os vencedores deste ano, se destacaram em Cannes respeitando as regrinhas básicas de legitimidade e autenticidade. E, o que é melhor, que influenciaram reais mudanças de comportamento e atitudes nas pessoas. Prova de que uma boa sacada criativa não precisa ser vazia para dar certo. E nem para ganhar Leão.
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